quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Perfectus

O mundo funciona quando gostamos uns dos outros. Mas também funciona quando os sentimentos são substituídos por artimanhas, jogadas, estratagemas. Funciona quando imprimimos amor àquilo que criamos, mas também funciona quando somos apenas marionetas no meio de virtuosos espectáculos de hipocrisia.

Não consigo conceber um conceito para "mundo perfeito". Talvez seja uma tarefa utópica, quiçá paradoxal, ou então apenas fora do alcance da minha modesta compreensão. Bem, talvez seja algo realmente inatingível.

Poderá o meu bem-estar e felicidade condicionar, de alguma forma, o bem-estar e felicidade dos outros? Certamente. Não será necessário enunciar exemplos sobejamente conhecidos para consubstanciar tal raciocínio. E é assim que o meu conceito de "mundo perfeito", aquele que eu não consigo conceber, cai por terra. Simplesmente porque, um "mundo perfeito", não existe: é irrealizável, é inconcretizável.

Como resultado desta breve reflexão, o meu ateísmo fica ligeiramente abalado. Afinal, o nosso "mundo imperfeito" poderá mesmo ter sido criado pelo deus de todos nós, aquele que, para alguns, é o "deus perfeito". Já o contrário... bem, o contrário não teria sido possível.

Porquê? Deixo ao vosso critério.


domingo, 4 de dezembro de 2011

Epílogo

Escrevi sobre florestas de mil árvores. Escrevi sobre desertos longínquos, sobre moinhos em noites de nevão, sobre viagens pelo infinito.

Muitas foram as vezes em que escrevi sobre deus e o diabo, sobre o céu e as trevas, sobre o destino e a eternidade. Muitas foram as vezes em que terei sido amaldiçoado, outra tantas abençoado.

Quase sempre escrevi sobre o amor, sobre a vida, sobre a felicidade. Tantos foram os abraços trocados, os beijos sentidos, os olhares apaixonados.

E se escrevi sobre a vida, também sobre a morte escrevi. E não há que ter vergonha de temê-la: é a nossa natureza.

Foram muitos os encontros e desencontros. Sentimentos, muitos, alvo de minuciosas reflexões.

O Universo nunca foi esquecido. Quantas estrelas não se cruzaram no nosso caminho, em pequenas jornadas literárias sobre sonhos por realizar.

O sol. A lua. O mar. A amizade. E o amor sempre presente.

Este é o epílogo de uma era repleta de tudo.


sábado, 19 de novembro de 2011

Subestima


Dei de caras com a Morte num páramo distante. Local inóspito, gelado, de terra árida e consumido pelo tempo. Se em sentido figurado me estivesse a expressar, quem sabe não teria uma história peculiar para expor. Dar de caras com a Morte e estar cá para contar.

Mas não, apesar de ser um fervoroso adepto da tropologia, o que realmente sucedeu foi um encontro fortuito com o esqueleto nu, armado de foice.

E ali estava ela, a Morte, sentada numa cadeira de baloiço de aspecto antigo, absorta em infindáveis cogitações. Creio que não deu pela minha presença, como se de um espírito eu me tratasse. Sentei-me no chão, a alguns metros do "fim da vida", e contemplei-a durante largos momentos, tentando encontrar nela algum rasgo de beleza latente. Tornou-se penoso viver aquele momento mortificante, perante um ser notoriamente abalado, moribundo, desgastado.

A Morte proferia umas quantas palavras soltas, como se por um violento estado febril estivesse a ser atacada. O quão ridículo me senti, por toda a vida ter temido uma figura tão aparentemente inócua.

Ergui-me, e com um misto de sobranceria e compaixão a fervilhar dentro de mim, deixei para trás a Morte. Não foi necessária uma dúzia de metros para que, aleivosamente, a dita cuja se aproximasse de mim e me apunhalasse pelas costas.

A subestima é, sem dúvida, o mais traiçoeiro de todos os sentimentos.


segunda-feira, 16 de maio de 2011

Guerreiro incansável


Era um pensamento que lhe paralisava todas e quaisquer vontades, que lhe encobria todas e quaisquer visões sobre o futuro. Na sua cabeça, apenas um conceito reinava: o tempo estava a acabar.
Havia sido um Guerreiro incansável toda a sua vida, verdadeiro Herói em tantos momentos próprios de realidades absolutamente desvirtuadas. Uma vez feita justiça, motivo de orgulho para a maior parte, fomento de ódio para alguns.
Há século e meio atrás, disse um génio literário russo que se queres vencer o mundo inteiro, vence-te a ti mesmo”. Estou crente que é essa a batalha que, neste preciso momento, é travada pelo Guerreiro incansável. Não será, indubitavelmente, uma batalha fácil de vencer: esta dura há já uns anos, embora com o inimigo a fraquejar violentamente nos tempos mais recentes.
Antes da batalha vencida, o Guerreiro incansável já conseguiu, no entanto, domar o seu irredutível pensamento. O tempo não será eterno, não o é para ninguém, bem o sabemos. Contudo...
...as suas histórias, as suas aventuras... ainda terá que as contar aos seus netos!


segunda-feira, 9 de maio de 2011

Dogmas, convicções e verdades absolutas


Um dia, acordarás após uma longa e desconcertante reflexão. Para quê uma vida baseada em dogmas, quando é tão simples questionar as coisas?
Explica-me o porquê de viveres prisioneiro de verdades absolutas, verdades que tu nem sequer tens a capacidade de compreender?
Para quê viver mergulhado em convicções sem substância, convicções que tu não és capaz de defender?
Não, não necessitas do coeficiente de inteligência de um génio. Afinal, será preciso tanto para aspirar a uma vida diferente da de um rebanho que apenas segue as ordens do seu pastor?
Questiona-te. Procura o porquê das coisas. Não acredites em tudo o que ouves, em tudo o que vês. A ingenuidade poderá ser-te útil em algumas ocasiões da tua vida, mas certamente que a ignorância não será a tua melhor conselheira nos momentos mais complicados. Procura o equilíbrio no mundo que te rodeia, no sentido que almejas para a tua vida. Não sejas céptico em relação ao que desconheces: o desconhecido não terá que ser, forçosamente, aterrador nem, tão-pouco, quimérico.
Procura o amor que fará de ti uma pessoa melhor. Nunca desistas de o encontrar. Poderás não saber o dia em que tal irá acontecer, e a espera poderá parecer eterna...
...mas, uma coisa é certa: à medida que o tempo for passando, estarás cada vez mais perto desse momento.


quinta-feira, 5 de maio de 2011

A tua ferida aberta


Maldita traição. Surgiu, inesperadamente, com pezinhos de lã. Uma traição assim, não sei se custará mais a suportar. Dói no coração, dói no espírito, dói no âmago do nosso ser.
Sorrateiramente, foi ganhando forma com o florescer de mentiras que não quiseste ver. Traição matreira, qual raposa à espera do momento em que o coelho coloca as orelhas fora da toca.
Velhaca. Foi uma traição verdadeiramente velhaca, que nunca, em momento algum, te ofereceu motivos para desconfiança. Como foi possível teres sido ludibriado com tamanho requinte? Neste momento, choras. Porquê? Para quê? Com que intuito? Amor próprio ferido? Ou, quem sabe, ódio efervescente?
Sim, eu sei. Irascível é como te sentes. Aprende a dominar a tua ira. Doutra forma, é como se andasses de óculos escuros e bengala à beira de um precipício: certamente não chegarás a bom porto.
Não, não há nada a fazer. Retira, para ti, a moral da história, e aproveita para olhar em frente de cabeça erguida. Como foi dito um dia, “cometem-se muito mais traições por fraqueza, do que em consequência de um forte desejo de trair”.
Portanto, dá o exemplo e sê forte. Não cedas, tu mesmo, a nenhuma leviana e vingativa traição.


segunda-feira, 25 de abril de 2011

Compromisso


Compromisso. Não é mais que uma “promessa mútua”, como o dicionário tão bem define. Assumindo-se um compromisso, assume-se uma obrigação com alguém, com algum objectivo ou propósito. Um compromisso, que se poderá definir, igualmente, como uma declaração de princípios, deriva do latim compromissum, referindo-se à palavra que se honra.
Podendo, o compromisso, ser considerado uma responsabilidade adquirida, a partir do momento em que não cumpro a minha palavra, serei, inegavelmente, um irresponsável. Mas não apenas um irresponsável. Coloquemos, pois, no prato da balança, alguns dos conceitos já referidos: promessa, obrigação, princípios, palavra de honra, responsabilidade. Será, então, um fardo difícil de carregar? Provavelmente qual dúvida hipócrita , não estará ao alcance de todos. E isso talvez explique o facto de serem tantos aqueles que não são capazes de assumir e honrar os seus compromissos.
Creio que estará ao alcance de qualquer um a compreensão da essencial coexistência entre compromisso e dificuldade. Ou terá vindo alguém, em algum momento das nossas vidas, segredar-nos ao ouvido o quão é fácil assumir e cumprir aquilo com que nos comprometemos? Não sejamos ingénuos (não o somos).
Antes de assumirmos um compromisso com alguém, tenhamos consciência de que o primeiro compromisso de todos será sempre com o nosso eu interior. Nesse sentido, estarei certo de que o nosso eu interior não ficará nada agradado com a nossa (eventual) irresponsabilidade e falta de princípios.
Por fim, gostaria apenas de referir que esta reflexão não personalizada não pretende atingir ninguém em particular. Antes de a concretizar em palavras, assumi esse compromisso...


domingo, 17 de abril de 2011

A tua flor


A flor que te quis oferecer, semeei-a no teu jardim, exatamente no seu centro, longe da atenção dos pássaros que por ali esvoaçavam todas as manhãs e de todas as restantes flores protegidas pelos respetivos canteiros.


A flor que te quis oferecer, crescia com o mesmo entusiasmo que a minha paixão crescia por ti, verdadeiramente inebriada. Era uma flor que ganhava vida com os primeiros raios de sol matutinos, que ganhava o seu esplendor máximo quando o astro rei atingia o seu ponto mais alto no vasto céu azul.

Quando caía a noite, a flor fechava-se em copas no seu mundo, não deixando, no entanto, de perder um pouco que fosse da sua doce beleza.

Naquele pedaço de terra, até as ervas daninhas apresentavam um sentimento de especial devoção pelo ser mais belo do jardim, não se atrevendo, nunca, a chegar-lhe perto.

No dia em que a flor se tornou adulta, não fui capaz de a arrancar do solo. Eu não tinha esse direito.

Contudo, havia chegado um outro momento.

Trouxe-te até mim, até junto da flor que agora mesmo te ofereço.

Pois foi sob o olhar atento da tua flor, que por ti declarei o meu amor.


sábado, 9 de abril de 2011

O sítio aonde nos esperam


Laconicamente falando, e observando o cenário em seu redor, era com um sentimento de profundo asco que a maior parte das pessoas olhava para ela. O desgosto pelo bem alheio nunca terá um registo nobre. Ainda assim, permitam-me que vos diga: a inveja desmedida não poderá ser, alguma vez, tolerada.
Porém, por muito que nos custe acreditar, era a isso mesmo que se assistia. Se aos pares se cruzavam com ela, daí a nada, e já de costas voltadas, haveria lugar a uma arenga desdenhosa. Pois bem, a vida é feita de constantes julgamentos, quer estes ocorram nos seus lugares adequados, ou não.
Sem querer dar azo a divagações vãs, foquemo-nos apenas nos factos. Afinal, talvez não fosse o seu estado de graça o causador de tanto ódio e desdém, quantas vezes mal dissimulados. Havia um facto inegável e, igualmente, incontornável. Ela era deslumbrantemente bela. Pois se em terra de cegos, quem tem um olho é rei, então em terra de feios, quem é belo é crucificado.
Estaremos a ser severos? Não creio. A quantas iniquidades poderíamos assistir no seio de um local tão pequeno, onde a impunidade reina a seu bel-prazer?

Assombrosamente bela. Era-o, de facto. E estava apaixonada. Por quem? Não sabemos, mas talvez as boas sensações que o seu coração transmitia, fossem também responsáveis pela utópica perfeição das linhas do seu corpo e da brandura do seu espírito.
No entanto, e ainda que não fosse o seu desejo, a crescente caterva de escarnecedores foi aumentando o protagonismo da jovem musa que, um dia, não conseguindo resistir à constante pressão da sua beleza, se viu obrigada a fugir do local que a viu nascer.
Terá fugido para onde? E será que alguém aguardava a sua chegada? Pois será esse o nosso mais profundo desejo, que alguém a esperasse ansiosamente. Porquê? Porque podemos estar certos de uma coisa: sempre chegamos ao sítio aonde nos esperam.


segunda-feira, 28 de março de 2011

A mensagem


"Quando os viu, enfim, abraçados, Deus aplaudiu a tenacidade que se respirava no ar". Mas já lá vamos...

Estávamos no Verão. Viviam-se dias de pura felicidade, com calor na medida certa. Ela encontrava-se sozinha em casa, a contar os minutos para sair à rua. Vestiu o melhor vestido que tinha no seu guarda-roupa e soltou os seus longos cabelos morenos. Por fim, agarrou no seu batom preferido e pintou os lábios.

Por esta altura, ele já se encontra a caminho. O percurso que ainda tem pela frente é longo, mas isso pouco importa. Traz dentro de si a leveza de quem ama a vida, a inocência de quem nada teme.

Combinaram encontrar-se num farol de terra, local bem conhecido dos dois. Situava-se num dos pontos mais altos daquela pequena e tranquila cidade costeira, com vista para o outro lado do oceano.

Quando o relógio dela avisou ter chegado o momento para sair de casa, quando o Sol não estava longe de se pôr, o mundo desabou sobre aquela simpática localidade. O céu rapidamente se pintou de negro, tal era o número de nuvens tempestuosas. No instante seguinte, choveram do céu raios e trovões aos milhares, dando lugar ao espectáculo mais insólito que alguma vez aquele local havia presenciado. A chuva começou a cair impetuosamente, deixando no ar um aroma a dilúvio.

À porta de casa, ela olha o céu e inspira bem fundo. Sai a correr, com um sorriso bem rasgado nos lábios. Pelo caminho, em direcção ao farol, acaba por deixar para trás o calçado que trazia, correndo descalça e sentindo no corpo a chuva quente que, obstinadamente, não cessava. Desde que saíu de casa, não passaram, seguramente, mais que dez minutos até que alcançasse a imponente construção. Subiu as escadas com vigor, aproximando-se, em seguida, do enorme foco luminoso, assegurando-se que a cobertura que anteriormente ali havia colocado estava nas melhores condições. E assim era.

Sofrendo na pele, igualmente, a inusitada tempestade, ele procura - a todo o custo - vencer a distância que ainda o separa do farol.

No momento em que o dia, finalmente, dá lugar à noite, ela liga o potente projector de luz. No céu, sob o olhar atento de Deus, lê-se, projectada, uma mensagem que servirá de inspiração ao que resta do caminho que ele ainda tem para percorrer.

Uma vez alcançado o farol, após uma corrida que parecia não ter fim, ela corre para os seus braços.

Quando os viu, enfim, abraçados, Deus aplaudiu a tenacidade que se respirava no ar.

Ele olha o céu e pisca-Lhe o olho. Nos seus olhos brilha, reflectida, a mensagem representada no firmamento: "Até que a morte nos separe!".


sábado, 19 de março de 2011

A Lua


Todas as noites da sua vida, recuando até ao passado distante que a memória lhe permite recordar, a menina, hoje mulher, ía à janela contemplar a Lua.
As noites de Lua Nova, fenómeno que, durante muito tempo, se revestiu de enorme mistério para si, sempre foram as noites que mais lhe custaram a passar. Em todas as outras, as quais, para seu grande júbilo, preenchiam a maior parte do calendário, a menina despendia largos minutos a pedir conselhos, bem como alguns desejos, ao mais bonito dos astros satélite do nosso vasto sistema solar.
Apesar de nunca ter tido forma de o demonstrar, foi crescendo, no coração da Lua, um enorme sentimento de compaixão e amizade pela menina que, todas as noites, procurava junto de si um pouco de companhia.
Os anos foram passando, à medida que, sob o olhar atento da Lua, os sonhos da menina íam amadurecendo. Há muito que a Lua tinha conhecimento do seu sonho mais bonito, aquele em que esta conhecia o seu grande amor.
No dia em que a menina concretizou o seu sonho, a Lua não conseguiu conter a sua felicidade, tendo, na noite imediata, adquirido um tamanho admiravelmente encantador, combinado com uma tonalidade alaranjada apenas observável em momentos especiais como este: estava verdadeiramente feliz.
Pois aproveitemos hoje, a noite, para pedirmos à Lua os nossos desejos mais belos... ela está à nossa espera!


domingo, 13 de março de 2011

A vida é uma viagem



A vida é uma viagem. O senso comum já nos ensinou isso mesmo, que a vida é uma viagem no tempo. Mas desenganem-se aqueles que, ao julgarem as suas vidas estagnadas, inertes, imaginam que a viagem se encontra nas mesmas condições. A vida é uma viagem sem paragens. Aliás, permitam-me a correcção: a vida é uma viagem com uma única paragem. Mas essa espera-nos a todos.
Ao longo do espaço, a Terra desloca-se em torno do Sol. Desloca-se a uma velocidade aproximada de cem mil quilómetros por hora. Mas quando o ano termina, a Terra não voltou ao ponto de origem. E porquê? Porque a Terra não é o único astro em movimento. O próprio Sol desloca-se dentro da nossa Galáxia, que por sua vez também se desloca pelo Universo fora. Estima-se que a nossa Galáxia, a Via Láctea, se desloque a uma velocidade aproximada de dois milhões de quilómetros por hora.
Com estes dados científicos presentes na nossa mente, será difícil imaginar a vida como um processo estático no nosso mundo, em que após um momento a que damos o nome de nascimento, apenas nos poderá esperar um momento denominado fim (perdoem-me o medíocre eufemismo).
A viagem mais bonita que poderemos, então, realizar na nossa vida, será mesmo a viagem para a qual não precisamos de bilhete, nem tão-pouco de bagagem ou das férias que a permitam. E é por isso mesmo que a vida deverá ser sempre encarada com um sorriso. É por isso que a vida é muito mais bela quando gostamos de nós próprios, quando damos valor aos que gostam de nós, quando temos alguém que nos ama e a quem amamos de igual forma. Qualquer viagem poderá ter os seus contratempos, os seus percalços, os seus obstáculos. A vida não será, nunca, uma excepção. Mas com um sentimento de perseverança, qualquer dificuldade será agradavelmente ultrapassada.
Coloquem de parte quaisquer vaidades ou pretensões próprias de quem se julga capaz de carregar sozinho o mundo às costas, pois essa não será uma tarefa simples. Em sentido oposto, procurem sempre no amor a força e o encanto que poderá tornar a vossa viagem a mais perfeita de todas!


quinta-feira, 10 de março de 2011

De mãos dadas


Todos os dias, quando acordava, ele sentia a sua presença. Sentia o seu perfume, sentia os seus leves e inaudíveis passos. Imaginava-a assombrosamente bela, esperando que a memória nunca o traísse. Podia jurar que, por vezes, via a sombra dela reflectida ao lado da sua. Não mais que isso, apenas a sua sombra...
Todos os dias, ela tinha a oportunidade de o ver acordar. Seguia os seus passos, cuidadosamente, deixando o seu perfume a pairar por onde passava. Por vezes, por breves instantes, contemplava a sua própria beleza num qualquer espelho. Era apaixonada pela sombra dele, não o queria ver longe de si...
Quando, ao entardecer, ele decidia ir ver o pôr-do-sol junto ao mar, a sua sombra engrandecia. Nesses momentos, o coração dela gozava de uma felicidade extrema, sempre a seu lado até que o Sol desse lugar a um céu estrelado...
Nos dias de pôr-do-sol junto ao mar, ele regressava a casa, pesarosamente, carregando dentro de si um sentimento inexplicável.
Nesses dias, ao deitar-se, e quando o primeiro sonho se preparava para nascer, já ele dormia profundamente a seu lado, sempre de mãos dadas...


terça-feira, 8 de março de 2011

Quando...



Quando a tua flor é a única a resistir às intempéries, é porque o que sentes é verdadeiro.
Quando o vento não apaga as palavras que escreves na areia, é porque os teus sonhos já fazem parte do nosso mundo.
Quando o teu sorriso é uma constante, é porque a tua vida é uma harmonia de cores.
Quando o teu abraço é capaz de aquecer o coração dos outros, é porque o teu desígnio não fracassou.
Sê feliz!


domingo, 6 de março de 2011

Afrodite, a Deusa do Amor



Saíu cedo de casa, naquele dia que nada tinha de especial, dirigindo-se – de imediato – para o bosque que circundava o local onde vivia. Este bosque, contrariamente a muitos outros que habitam o nosso vasto mundo, não tinha um único rasgo de magia. Apesar das árvores que o constituiam serem já velhas anciãs, algumas com mais de mil anos, o bosque não nos transportava para qualquer realidade diferente daquela que nos apresentava: um número de árvores sem fim. Grandes, pequenas, altas, baixas, com muita ou nenhuma folhagem, havia tantas árvores e tão distintas umas das outras, que o bosque se sentia capaz de desafiar os poderes da criação.
Mas o rapaz, movido pela notória ausência de magia experienciada na enorme floresta, há muito que decidira fazer algo para alterar aquele cenário.
Não era a primeira vez que visitava o ponto central do bosque, local que a maior árvore da floresta havia escolhido para criar raízes. Uma vez lá chegado, pôde constatar que todo o material que anteriormente havia colocado junto à grande árvore, se encontrava imaculadamente intacto: tábuas, cordas, roldanas, pregos e demais ferramentas próprias de carpintaria. Na sua mochila, trazia mantimentos para uns tempos de estadia.
Lançadas mãos à obra, ao fim de três dias encontrava-se realizado o objectivo a que se propusera: construir uma casa a meio da grande árvore, aliçercada pelos robustos ramos que a compunham. A uma altura de cerca de cinquenta metros do solo, a vista sobre o bosque era grandiosa, dada a imponência que a árvore ostentava.
No entanto, o inesperado tomou lugar. De repente, as nuvens cobriram o Sol, e um dilúvio como nunca antes fora visto abateu-se sobre a floresta. Choveu ininterruptamente durante dois dias inteiros, fazendo do rapaz prisioneiro da casa que acabara de construir. Quando, finalmente, as nuvens decidiram dar tréguas, o nível da água tinha atingido os dez metros de altura. E foi nesse preciso momento que o rapaz, que até então desconhecia a sua fobia, se apercebeu do pavor que aquela imensidão de água lhe causava. A hidrofobia havia-lhe sido transmitida pelos seus antepassados ancestrais, algo de que nunca poderá desconfiar.
Voltas e mais voltas deu no diminuto abrigo resultante do seu empenho, ao mesmo tempo que a chuva regressava e regava copiosamente o incomensurável jardim de árvores que era aquele bosque. O medo da água intensificava-se, agora, enquanto que o desespero começava a ganhar força dentro de si, uma vez que os mantimentos que lhe restavam não chegariam para mais que um par de dias de sobrevivência.
Mas foi então que, das águas negras que banhavam o solo da floresta, emergiu a Deusa “nascida-da-espuma”. Afrodite, a Deusa do Amor, voou até junto da casa de madeira, pairando em frente do rapaz. Na companhia de dezenas de pombas brancas, ela surgiu com os seus longos cabelos molhados pela água fria do novo mar, transmitindo ao rapaz uma inusitada segurança. Este contemplava a beleza sobrenatural da Deusa, entretanto hipnotizado pelo seu olhar penetrante.

Afrodite esvoaçou, por breves momentos, em torno do abrigo, fazendo daquele bosque um local extraordinariamente mágico. No instante seguinte, voou até ao rapaz, envolvendo-o nos seus braços e viajando com ele para bem longe. Encontrado um lugar seguro, a Deusa do Amor despediu-se do rapaz com um beijo carregado de sedução, e com a promessa de que um dia se voltariam a encontrar.
Os anos passaram-se. Foi há bem pouco tempo que decidi voltar ao bosque. A grande árvore permanecia igual, com a casa de madeira bem lá no alto. O impulso foi apenas um: subir até ao abrigo, o sítio onde se encontravam guardados os momentos de magia daquele dia já distante.
Seria hipocrisia se dissesse que a minha reacção foi de surpresa ou perplexidade.
Afrodite esperava por mim. E eu fui ao seu encontro.


sábado, 26 de fevereiro de 2011

Canto do Mar


O ponto de encontro não ficava longe do centro da cidade. Era um local recatado, muito embora fizesse fronteita com o imenso mar que banhava toda a costa leste do país. Fazia frio, apesar da baixa temperatura não ser suficiente para provocar o desconforto físico próprio daquela altura do ano.

O Outono caminhava para os seus últimos dias, com o Sol a esforçar-se para manter acesa a sua chama.

O relógio marcava as três horas da tarde. Nenhum dos dois chegou atrasado ao local combinado, situação que se verificara devido à enorme ansiedade que cada um transportava dentro de si. Este encontro havia sido motivado por algo deveras insólito. Há exactamente um dia atrás, precisamente no mesmo segundo, do mesmo minuto, da mesma hora, cada um deles enviou ao outro a seguinte mensagem: “Tenho um segredo para te contar”.

O momento revestia-se de tamanha perplexidade, que no instante imediato decidiram encontrar-se no dia seguinte. Cada um deles, talvez por mútua transmissão de pensamentos, sentiu o ímpeto de escrever o seu segredo num pequeno pedaço de papel, o qual foi posteriormente dobrado em quatro partes iguais.

Voltando ao ponto de encontro, os dois sentaram-se lado a lado, virados para o mar e contemplando a serena rebentação das ondas. Nenhum deles o sabe, mas os seus corações, neste preciso momento, batem exactamente ao mesmo ritmo, compassadamente e com vigor.

Ao longe, ela consegue escutar o canto do mar. Está certa que o consegue; só poderá ser o canto do mar. Quanto tempo esperaram por este momento? O tempo de uma vida? Não sabemos. Conhecem-se há pouco mais de um ano, o tempo suficiente para se verem dissipadas quaisquer dúvidas.

Ele antecipa-se, e retira do seu bolso o segredo que tem para lhe revelar. Ela segue-lhe os movimentos, fazendo a mesma coisa.

Trocam de segredos, com dois sorrisos bem rasgados. Se o destino realmente existe, então este destino estaria de facto traçado.

Os dois pedaços de papel contêm a mesma palavra. Um “Amo-te” escrito com paixão, com a mesma paixão que os acompanhará em todos os passos das suas vidas.


sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

O Principezinho


Foi a sonhar que, um dia, conheceu o Principezinho. O sonho era de tal forma realista, que a primeira coisa que os seus lábios foram capazes de pronunciar foi:
– Principezinho, que fazes tu aqui...?
O cenário, contrariamente ao que seria de esperar, não se apresentava na forma de deserto, mas sim na de um aprazível e imensurável campo repleto das mais variadas e belas flores.
– Procuro a minha rosa – respondeu o Principezinho –, mas as flores aqui são tantas... ajudas-me a encontrá-la?
– Claro que sim – respondeu ela, agarrando na sua pequenina e delicada mão.
O sol estava pintado de um laranja que o nosso parco vocabulário nunca conseguirá descrever. Quanto ao céu, este estava apaixonantemente admirável, refulgindo essa mesma intensidade em todas as flores do vasto campo. À passagem dos dois passeantes, estas pareciam sorrir.
– Como te chamas? – perguntou o Principezinho.
– Eu... eu... eu não me lembro do meu nome! – exclamou ela, como que desconcertada com a súbita amnésia.
– Deixa, não te preocupes... tens ar de sonhadora, chamar-te-ei Sonhadora. Importas-te?
– Não, claro que não me importo, Principezinho – ao mesmo tempo que fazia um esforço sobre-humano para se recordar do seu próprio nome.
– Sonhadora, nós não encontramos a minha rosa...
– Não fiques triste, Principezinho. Havemos de encontrá-la, mas se isso não acontecer...
– Se isso não acontecer...? – interrompeu-a o Principezinho, com os seus intensos olhos azuis já lavados em lágrimas – Tenho que encontrar a minha rosa, doutra forma nunca mais serei feliz.
– Olha ao teu redor, já viste quantas flores os teus olhos conseguem alcançar? Estou certa de que iremos encontrar uma rosa tão linda como a tua – acrescentou a Sonhadora, tentando reconfortá-lo.
– Não, não... – respondeu o Principezinho, com a voz trémula e um semblante carregado – Tu és feliz, Sonhadora?
Ela não esperava esta pergunta.
– Sou muito feliz, Principezinho – respondeu ela, de uma forma notoriamente evasiva – Mas porquê? – perguntou, ansiosa.
– Tu não és feliz, Sonhadora. Os teus olhos não mentem... não irradiam paixão. Olha o céu.
– Olho o céu? O que tem o céu?
– Não vês? O céu está apaixonado. Repara na sua cor! – exclamou o Principezinho – Sonhadora, Sonhadora!
– O que foi, Principezinho? – perguntou, assustada.
– Encontrei a minha rosa! – gritou ele, contemplando a sua flor de um modo singularmente apaixonado – Agora é a tua vez, Sonhadora... acorda!

Ela acorda e sorri. A vida está à sua espera!


domingo, 30 de janeiro de 2011

Vamos sonhar


Sabias que... nas noites em que acordas a meio de um sonho e o consegues trazer para a realidade, esse sonho ficará para sempre registado no nosso mundo? E sabias que... se o sonho tiver algo de fantástico, algo que o mundo nunca antes tenha visto, ele fará de ti alguém especial?

E se a quimera suplantar a realidade, se a fantasia se apoderar do nosso mundo, que então seja para nos tornar super-heróis, capazes de eliminar todo o mal atávico que nos acompanha desde sempre.

Vamos sonhar... com todas as nossa forças!


quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

A carta


A carta acabara de cair aos seus pés, transportada pelo vento. Quando terminou de a ler, sentiu-se perdida. As palavras registadas naquele pequeno pedaço de papel tiveram o condão de lhe imprimir um sentimento de tristeza como nunca antes tinha vivido. A única coisa que se viu capaz de fazer naquele momento foi fechar os olhos, desejando que tudo aquilo não passasse de um sonho mau.

De olhos fechados, e com o vento a soprar sorrateiramente, a leveza que em seguida sentiu deixou-a perplexa. Podia jurar que o seu espírito se desprendia do seu corpo, algo que lhe começava a permitir esquecer a melancolia que a atingira momentos antes.

A perplexidade inicial foi prontamente substituída por um medo imenso, ao mesmo tempo que, instintivamente, abria os olhos e se deparava com uma nova realidade, uma espécie de versão acelerada da realidade que conhecemos. Pôde ver-se a si, estendida naquele chão de erva rasa e num estado de enorme desgosto, com os seus cabelos loiros resplandecendo e os seus olhos chorando rios de lágrimas.

Pois naquela extraordinária realidade, a vida apresentava-se sôfrega. Foi num ápice que as suas lágrimas, entranhadas por terra adentro, deram origem a uma lindíssima flor. No instante seguinte, uma rajada de vento inusitada arrancou do solo, com violência, a flor, transportando-a, pelo ar, até aos meus pés. Espantado, agacho-me e apanho-a, sentindo um súbito estremecimento.

Tiro do bolso do casaco uma folha de papel e uma caneta, que rapidamente dão origem à carta que a fez chorar.

Pergunto: em que realidade vivemos nós?