sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O amor (parte II)


Estávamos sentados no topo do telhado daquela casa. Da nossa casa. Encostada ao meu peito, ouvias bater o meu coração, com os teus longos cabelos cor de mel a adocicarem o momento.

Era o primeiro dia soalheiro daquele impetuoso outono. O Sol, preguiçoso, começava a esconder-se por detrás do horizonte.

“Conta-me uma estória”, pediste-me. O teu olhar incendiou-me o espírito, ao mesmo tempo que caía a última folha do castanheiro vizinho, presença assídua em tantas tardes de namoro.

“Era uma vez um menino que andava perdido no mundo. Havia-se perdido dos seus pais no meio de uma forte tempestade, tendo ficado só e desamparado num mundo que não era o seu.

O menino, lutador nato e guerreiro incansável, nunca desistiu de procurar a sua família, tendo um dia tomado conhecimento do infortúnio que se lhe havia apresentado: encontrava-se definitivamente sozinho neste mundo. A tempestade não havia poupado vidas, com excepção apenas da sua.

Sem nunca se resignar, o menino não olhou para o passado. Apagou as cicatrizes da sua alma, e prosseguiu viagem. Durante anos, viveu nómada e amante da Natureza. Percorreu os fiordes da costa oeste da Noruega, onde aprendeu um pouco da história Viking. Navegou nas águas do rio Verdon, no sudoeste de França, onde absorveu o poder dos deuses e espíritos da Natureza. Combateu os seus medos ancestrais nas Covas de Frasassi, o maravilhoso mundo subterrâneo de Itália. Desceu as águas do rio Nilo, a semente da fertilidade do Egipto. Chorou ao contemplar a beleza imensurável das montanhas de Ruwenzori, na fronteira entre o Congo e o Uganda. Nadou nas águas do Mar Morto, de mãos dadas com a história bíblica. Mas foi nas colinas de Kuei-Ling, nos conhecidos penhascos de pão de açúcar da China, que encontrou finalmente a paz.

O regresso às origens foi algo natural, algo que o seu subconsciente há muito procurava. O menino avistou, ao longe, uma árvore, sozinha numa vasta planície. Era Primavera, e as suas folhas dançavam ao sabor do vento. O castanheiro era uma figura marcante daquela paisagem.

Pois foi junto à grande árvore que o menino a encontrou. Com os seus longos cabelos cor de mel e o seu olhar profundo, a paixão nasceu num segundo.

E até hoje, as suas vidas são uma só.”

“Eu conheço essa estória”, dizes-me com aquele sorriso só teu. “E eu amo esse menino”, acrescentas por fim...


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