domingo, 27 de dezembro de 2009
Sempiterno
As nuvens cercavam o Sol, deixando-o num estado de timidez latente. De soslaio olhava para a Lua, que tão simplesmente o ignorava.
Alheia a estas vicissitudes andavas tu, correndo como se não houvesse um amanhã.
A jornada não tinha destino, não tinhas uma meta à tua espera. Corrias porque sim, enquanto as nuvens começavam a chorar.
Lágrimas de água doce escorriam pelo teu corpo, convidando a terra sob os teus pés a dar vida ao mundo.
As flores pareciam renascer, as árvores tocavam agora o céu. O Sol perdia a timidez ao ver a Lua adormecida.
Nada te detinha, e a corrida parecia não ter fim. Os pensamentos emergiam à mesma velocidade que a paisagem ficava para trás. Qual era, afinal, o teu destino?
E quando o corpo começava a enfraquecer, e a pergunta ganhava forma, eis que vislumbras a sua figura ao longe.
E foi num ímpeto que correste para mim, rasgando o ar que nos separava.
Enquanto o Sol for Príncipe, e a Lua a sua Princesa, o nosso abraço será sempiterno.
domingo, 13 de dezembro de 2009
O amor
O destino de cada um estava traçado desde o nascimento do Universo. A cadeia de acontecimentos despertada pela grande explosão determinou o seu encontro naquele dia, naquele local, naquele instante.
Estava escrito que ela apareceria vestida de branco. Era Verão, e os seus longos cabelos loiros davam sentido à palavra harmonia. Seria o acaso que lhes daria a oportunidade de se olharem, de sorrirem um para o outro, dela ruborizar e dele proferir um “Olá…”.
Mas deus, num celestial acesso de fúria, abriu a terra no local predestinado. Irado com os vitupérios que se iam dizendo a seu respeito na Terra, não vislumbrou outra alternativa senão aquela.
E o mundo, tal qual o conhecemos, ficou dividido em dois. O medo incendiou-se dentro do coração de cada um, não deixando espaço a qualquer outro sentimento. Apenas se vislumbravam seres errantes vagueando por cada meio mundo.
Aos mais resistentes, nos quais o medo não venceu o amor, nasceram asas de Anjo. E foi, num conúbio perfeito, que esse amor voltou a unir o mundo. Porque, sem amor, nunca nada será possível.
Os, até então, quase amantes, puderam então ser amantes em pleno. O desígnio estava, de facto, desenhado.
Quanto a deus, este não foi castigado. Pois deus está em todo o lado, e – ainda assim – nunca se deixa apanhar...
segunda-feira, 7 de dezembro de 2009
Pequena mancha trigueira
Parecia o Jardim do Éden, mas não o era. Não havia frutos proibidos, muito menos serpentes.
O lugar era um misto de pureza, leveza, imaculabilidade. Caminhavas a meu lado, abanando a tua cauda de um lado para o outro.
Pequeno ser de quatro patas, não passas de uma mancha negra neste quadro de cores e arco-íris. Sobranceria menosprezadora a minha, é claro que és mais do que uma pequena mancha trigueira.
És vida, és felicidade, és contentamento, és alegria, és amizade! Tens a alma de um cachorro, corres pelo campo como se corresses atrás da vida.
Pouco interessa quem te abandonou…
Hoje, estás connosco!
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Amizade
quarta-feira, 2 de dezembro de 2009
Por entre as estrelas...
Percorríamos o Universo, em busca da felicidade eterna. Havíamos descoberto o elixir da juventude: viajar acima da velocidade da luz mantinha-nos jovens. A Paixão que nos unia, mantinha-nos vivos.
Para trás havia ficado a Terra, Marte, Júpiter, e todos os outros astros que constituem o Sistema Solar. O nosso combustível era o Amor, e nada nos fazia parar. Viajámos por toda a Via Láctea, seduzidos pelo sentimento que nos ligava.
O Universo era único, de um esplendor nunca antes por nós imaginado. As estrelas insondadas sucediam-se, cada uma mais brilhante e impetuosa que a anterior.
Tivesse eu o dom da ubiquidade, e num instante os mistérios do desconhecido passariam a fazer parte do meu diário.
Contar-te-ia histórias de encantar, que dariam cor à nossa vida. A viagem seria eterna, tal qual a felicidade que desejávamos.
No entanto, foi num dos recantos do imenso Universo que nos perdemos um do outro.
Por entre as estrelas, continuo a chamar por ti.
Por entre as estrelas, choras a minha ausência.
segunda-feira, 23 de novembro de 2009
No meio das trevas
No meio das trevas, te encontrei. Com um vestido comprido de cor púrpura, o chão tingia-se de negro a cada passo dos teus pés descalços.
A paisagem era hostil, e o vento que corria arrepiava-me a espinha. Murmuravas palavras bonitas, as quais sufocavam as flores no teu caminho.
De quando em vez, olhavas por cima do ombro e sorrias-me. “O quanto eu gosto de ti”, dizias para ti mesma.
Sabias que era o impossível que estava em jogo. Realidades ímpares, um amor sem precedentes. E se realmente este é eterno, como dizem os entendidos, então porquê fugir do inevitável?
Apenas querias a minha paixão, e eu apenas te pedia um último abraço.
E foi por isso que eu corri para ti, e tu te deixaste alcançar.
E foi por isso que eu te abracei, e tu deixaste escapar…
“O quanto eu gosto de ti”.
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Amor
terça-feira, 10 de novembro de 2009
Este sono será eterno
Era Primavera, mas a vida não era fácil. As flores não cuspiam pólen, as abelhas não o apresavam.
Carregavas uma cruz aos ombros, mas tão pouco eras Cristo. A terra era inóspita, e nas areias movediças até a alma se via sepultada.
Procuravas o teu lugar, mas as interrogações não te davam tréguas. O céu era laranja, o sol nunca havia antes sido negro.
Sonhavas com um mundo com vida, mas foi este o destino que te foi traçado. O castigo nunca foi justo para quem não é culpado.
Sorris, uma última vez, e fechas os olhos.
Este sono será eterno.
sábado, 31 de outubro de 2009
Cara ou coroa?
“E porque não escrever sobre lágrimas?”, pensou ele. Haviam decorrido quatro dias desde a primeira queda vertiginosa ao solo. Desde então, as lágrimas não mais tinham parado de percorrer o seu único trajecto conhecido: o da gravidade.
A tarefa afigurava-se impraticável. Com os olhos inchados de tanto lacrimejar, a escrita virava costas ao escritor. Lágrima atrás de lágrima, borrão atrás de borrão, o nosso herói abandona o papel gatafunhado e lança uma moeda ao ar: cara ou coroa?
Pouco importa, pois darás por ti a ludibriar o resultado, ordenando a consciência a acreditar que aquele era o resultado pretendido.
Polegar flectido por baixo do indicador, a catapulta sempre funciona, qual fundíbulo de carne e osso. A moeda voa formando uma parábola, cujos eixos quase se tocam.
A piscina formada pelas lágrimas aguarda pelo impacto, o tempo abranda. A moeda rompe a película superficial, avança até ao fundo, e…
…cara ou coroa? A dita logrou-te as expectativas. Moeda ao ar não cai de pé… mas desta vez, caiu.
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Reflexão
terça-feira, 27 de outubro de 2009
Sem destino
De mim voaste para bem longe... com as asas até então minhas...
Sem elas nunca conseguirei encontrar-te, sem elas a viagem torna-se ingrata.
Com uma venda nos olhos é como me sinto, de pés e mãos atados, imóvel e flutuando sobre o oceano, no ponto onde a latitude e a longitude igualam o zero absoluto.
Sinto-me um zero. Um zero no meio do oceano, onde a Lua africana desempenha o papel de inquisidora. “Quem és tu nesse mundo? Não és nada, nada foste, nada serás. Desaparece.”
A prisão desfaz-se, mas nem por isso vislumbro mais que um passo diante dos meus olhos. Sinto o frio do oceano, oceano que vira pulmão de aço para me manter refém do meu próprio destino.
Mas qual destino? Existirá realmente um?
Permanecerá a dúvida... sem destino definido.
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
O alter-ego
Tenho cinco anos. Não terei mais que isso. Estou no meu quarto, sozinho, e estendo as minhas pequenas mãos para a frente. Tomo consciência de que sou um ser racional, de que tenho uma consciência, de que estou vivo, de que existo. Agradeço a Deus a minha existência neste mundo (agradecimento, esse, provocado pela ingenuidade da idade), e sou assomado por uma felicidade sem fim.
A criança conhece, finalmente, o seu alter-ego. E nada voltará a ser como foi…
sábado, 10 de outubro de 2009
deus
Eram três horas da manhã. Abri os olhos e olhei o tecto e levantei-Me e calcei os chinelos e dirigi-Me à varanda.
Lá chegado, encontrei deus sentado na Minha poltrona, disposta num dos cantos do eirado.
Contemplava o céu estrelado, certamente absorto nuns quaisquer pensamentos. Não era o deus que Eu imaginava. Estranhamente, apesar de se encontrar sentado, afigurava-se mais pequeno que Eu.
Começando a sentir-Me incomodado com o silêncio do momento, ganhei coragem e decidi questioná-lo:
“Deus Meu, em que pensas tu?”
“Sabes…”, disse-Me, “estou cansado de ser o ser supremo, o todo-o-poderoso, o senhor do universo, o maior existente, a figura divina máxima. Estou cansado de ser a fonte de toda a obrigação moral, de ser o responsável pela vida e pela morte, pela felicidade e pela tristeza.”
“Mas… que queres dizer com isso, deus Meu?”
“O que quero dizer é que, de ora em diante, serás Tu a ocupar o meu lugar.”
“O teu lugar? Como assim? Se te referes à poltrona, considera-la tua! Não mais preciso dela. Aliás, nem sequer Me sinto digno de Me voltar a sentar nela.”
E deus sorriu.
“Não, não quero a Tua poltrona. Continua a ser Tua, como o sempre foi.”, reforçou. “Chegou o dia de renunciar ao meu estatuto de divindade. Chegou o dia de abraçares esta nova etapa, com a mesma paixão com que tens abraçado a Tua vida. Não receies, não temas, apenas desfruta”.
E, ao mesmo tempo que estas últimas palavras são proferidas, é então que Me sinto… Deus.
Eram três horas da manhã. O deus pequeno levanta-se e abraça-Me e caminha para o Meu quarto e deita-se e fecha os olhos.
Sento-Me na poltrona. Olho o céu estrelado, e perco-Me nos Meus pensamentos.
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Deus
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
Percorrendo o infinito
Acordado, a olhar para o infinito, o rosto apoiado na mão esquerda...
Sonho contigo. Conheço-te numa viagem, em que sou viajante solitário...
Amor à primeira vista, uma empatia impossível de traduzir em palavras...
Será esta viagem, uma viagem sem destino? Ou antes uma viagem com um final chamado destino?
Por momentos, sinto-me apaixonado... o inconsciente sussurra: “não te distraias, continua…”.
Passamos horas a conversar, trocamos mil e uma palavras… cada uma delas ferindo-nos de paixão.
Se o meu nome for Sol, o teu nome será Lua… e andaremos de mão dada para sempre, percorrendo o infinito.
Desperto. Ainda sinto o teu perfume…
Na magia de um moinho
Neva lá fora… o frio, esse, reina no mundo exterior.
No interior do moinho, assim como no interior do seu coração, sente-se um calor apaixonado, capaz de derreter a neve que irrompe da escuridão do imenso céu. Cai a noite.
Ela espreita lá fora, enquanto sussurra junto à janela: “Tenho saudades tuas…”.
Ele, sentado no primeiro degrau da escada em caracol, olha na direcção da janela. Não a consegue ver.
Os seus espíritos, hoje separados pela linha invisível que separa a vida da morte, anseiam pelo momento em que se poderão voltar a abraçar, e a tornar um só.
Ela chora. Chora um choro sem fim, acabando por se afogar nas suas próprias lágrimas…
No cimo de um monte, num moinho envolto de magia, duas almas, outrora gémeas, gémeas novamente, unem-se num abraço eterno e verdadeiro…
Perdido no deserto
O vento queimava-me o espírito, qual fogo capaz de me consumir por dentro. O pensamento ía longe, não deixando lugar a dor ou qualquer expressão de sofrimento. Um corpo perdido no deserto, com o pensamento perdido noutro mundo. Um mundo distante, que nenhum adjectivo conseguiria descrever. Utópico seria o epíteto correcto, numa conjugação de palavras que me fez regressar ao mundo real, permitindo que esse mesmo pensamento, aquele perdido noutro mundo, se perdesse agora por entre a fina areia do imenso deserto. Não te encontro. O meu corpo, errante no deserto, procura-te incansavelmente, num horizonte que ganhou vida e se tornou imortal. E se eu nunca te encontrar? Vagueará o meu espírito, eternamente, por todos os mundos ainda por descobrir, na ânsia de um conforto?
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Solidão
Numa floresta de mil árvores
Numa floresta de mil árvores, encontro-te aninhada no topo da mais alta. Num sono profundo, com o Sol a espelhar o seu brilho no teu rosto, deixas escapar algumas palavras bonitas: “Só há um remédio para o amor: amar mais, descobrirmo-nos e completarmo-nos com o outro, enlouquecer de desejo e depois amar ainda mais”.
Não sou capaz de te acordar. Ao invés disso, contemplo-te até se fazer noite, e o Sol dar lugar à Lua.
Hipnotizado pelo teu encanto, acabo por adormecer a teu lado. Mergulhado nos meus sonhos, deixo também escapar umas palavras: “Serei feliz, ao morrer, se tiver vivido uma vida completa, vivida com paixão, com a mesma paixão do primeiro abraço que trocámos”.
Despertas com as minhas palavras. Não és capaz de me acordar. Ao invés disso, contemplas-me até se fazer dia, e a Lua dar lugar ao Sol…
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Amor
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