quarta-feira, 26 de setembro de 2012

O caminho

Sónia Guerreiro 
Tenho saudades de escrever para ti, mas não te conheço.

A carta voa para um destino incerto, na esperança de ser recebida pelas mãos que a esperam.

Transportada pelo vento, vai perdendo, ao longo do seu trajeto, as palavras que te escrevi.

Atravessa uma tempestade, talvez duas, antes de cair aos teus pés.

"Gosto muito de ti", foi a única frase que a folha de papel guardou.

No céu, o teu sorriso desperta um arco-íris, o sinal pelo qual eu sempre esperei.

Agora, que conheço o caminho, o mundo é meu para sempre.


domingo, 23 de setembro de 2012

Sem tempo

Disseram-me que eu tinha apenas cinco minutos para escrever. Irritei-me. Exasperado, gritei, praguejei, insultei Jesus Cristo, Nosso Senhor.

Somos levados a crer que o tempo cura tudo. Cura? Mesmo? Aquilo que o tempo faz não é magia, como se de um mágico se tratasse, e também não é o remédio para nada, assumida a personificação de um curandeiro. O tempo apenas nos coloca, a cada segundo que passa, mais perto do nosso destino.

E se a verdade custa a ser aceite, então nada mais haverá a fazer que esperar. Pois o tempo tudo cura, ou não?

Momentos há, na nossa vida, em que o tempo simplesmente pára. E esses momentos, não são mais que feridas curadas por um tempo que não passou, não são mais que as cicatrizes da nossa memória.

O relógio já marca dez minutos desde há pouco. Maldito sejas, tempo.


sábado, 22 de setembro de 2012

A tua estrela

As estrelas vão lá estar sempre, sim. Porque irão, para toda a eternidade, guardar inúmeros segredos que não nos poderão ser revelados. Porque a distância é imensurável, e seria necessário um número infinito de vidas para as alcançar.

Quando choras, a tua estrela perde força. O seu fogo ardente é assolado por uma chuva miudinha de lágrimas, as tuas lágrimas, que surgem de um sítio distante mas tão próximo de mim: do teu coração.

E porque chora ele, cujas lágrimas arrefecem aquele local inóspito que não é a terra nem o céu? E as saudades, porque sufocam elas a tua estrela, deixando-a num estado de inusitado desespero?

As lágrimas que não consegues conter, as saudades que não deixas de sentir, o amor em que só nós os dois existimos. Não deixes a tua estrela morrer...


sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Egoísmo endémico e afins


Egoísmo endémico. Este, que nos rodeia, que nos corre nas veias, que se propaga como uma epidemia.

Inexistência de altruísmo, busca incessante da satisfação (única) dos nossos interesses, atropelando, sem escrúpulos, todos aqueles que se atravessam no nosso caminho.

Filantropia utópica, existente apenas nos livros, apregoada  ainda assim  por aqueles que ditam as regras do jogo.

Quem é que abriu a caixa de pandora, cujos todos os males se abateram sobre nós? Preparem-se, pois a miséria ainda agora começou, e a panaceia só se encontra disponível para os falaciosos predestinados. 

Para onde caminhamos?


sábado, 1 de setembro de 2012

O vazio

O frio que se fazia sentir dentro de nós rasgava-nos o espírito como uma noite de tempestade em alto mar.

Espíritos desfeitos, derrotados por uma desmedida falta de esperança, de alento, de fôlego.

Os sorrisos, esses, há muito que deixaram de existir, tendo ficado apenas, no seu lugar, umas quantas pregas na pele dos nossos rostos, representando uma ténue lembrança daquilo que um dia foram.

As estrelas sempre lá estiveram, indicando-nos o caminho a seguir. Presos a uma tenacidade falaciosa, o caminho que seguimos foi o mais duro, o mais penoso, o mais acerbado, como se tivéssemos optado por percorrer o mundo de mãos dadas sobre um caminho em brasas.

Hoje, pouco ou nada resta de nós. Corpos vagabundos, hospedeiros de espíritos errantes, reduzidos a uma insignificância miserável, qual universo vociferante a explodir dentro de nós.

Se outrora fomos um só, hoje não somos mais que mil pedaços espalhados ao vento, num vazio que tudo consome e em que nada existe.