sábado, 19 de novembro de 2011

Subestima


Dei de caras com a Morte num páramo distante. Local inóspito, gelado, de terra árida e consumido pelo tempo. Se em sentido figurado me estivesse a expressar, quem sabe não teria uma história peculiar para expor. Dar de caras com a Morte e estar cá para contar.

Mas não, apesar de ser um fervoroso adepto da tropologia, o que realmente sucedeu foi um encontro fortuito com o esqueleto nu, armado de foice.

E ali estava ela, a Morte, sentada numa cadeira de baloiço de aspecto antigo, absorta em infindáveis cogitações. Creio que não deu pela minha presença, como se de um espírito eu me tratasse. Sentei-me no chão, a alguns metros do "fim da vida", e contemplei-a durante largos momentos, tentando encontrar nela algum rasgo de beleza latente. Tornou-se penoso viver aquele momento mortificante, perante um ser notoriamente abalado, moribundo, desgastado.

A Morte proferia umas quantas palavras soltas, como se por um violento estado febril estivesse a ser atacada. O quão ridículo me senti, por toda a vida ter temido uma figura tão aparentemente inócua.

Ergui-me, e com um misto de sobranceria e compaixão a fervilhar dentro de mim, deixei para trás a Morte. Não foi necessária uma dúzia de metros para que, aleivosamente, a dita cuja se aproximasse de mim e me apunhalasse pelas costas.

A subestima é, sem dúvida, o mais traiçoeiro de todos os sentimentos.